quinta-feira, 29 de março de 2007

Devoradora de livros é também a Carolina, que hoje - juntamente com mais meninos que brincavam no Jardim da Estrela - ficou fascinada com a história de "O Urso Amarelo" (leia-se Ussinho Amalelo), escrita pelas "companheiras" de diversas "Uma Aventura" da minha juventude e ilustrada pela minha querida Danuta (com apelido difícil de soletrar, mas aqui vai) Wojciechowska. Se a Carolina aqui estivesse, diria Oigada!; como não está, obrigada, Danuta!
Estou órfã de livro.

Acabei de ler as "Travessuras da Menina Má" do Mario Vargas Llosa e agora estou perdida, triste, só e abandonada. (Verdadeiramente gelada - o vento não ajuda nessa matéria.)

Gostei tanto do livro que o li naquela urgência ambivalente de saber como continua a história mas de não querer chegar ao fim, para não ficar sozinha. Soube-me tão bem devorar um livro e encaixá-lo em cada pequeno hiato de actividade arrumatória!

segunda-feira, 26 de março de 2007

Modo: mudanças

Estou em "modo: mudanças" há para cima de um tempão. Já estou cansada - para não dizer farta! - e quase se pode dizer que ainda a procissão vai no adro. Certo que já mudei a caixotada toda para a arrecadação dos meus pais; mas agora falta arrumar a própria arrecadação.

No processo, juntei tanta roupa para dar e deitei tanta coisa fora que quase me parece inacreditável que tivesse acumulado tudo aquilo lá em casa. Hoje, por exemplo, descobri trabalhos da escola secundária que até agora tinham sido fielmente preservados. Graças ao balanço da triagem dos dias anteriores, encontrei em mim a indiferença suficiente em relação àquelas recordações para enfiar tudo no ecoponto, sem passar pela casa da partida nem receber dois contos, que é como quem diz: sem o mínimo remorso. Vi os desenhos, lembrei-me das circunstâncias em que os fiz e acho que assim cumpriram a sua última função de lembranças. Que descansem agora em paz e contribuam para muito, bom e inspirado papel reciclado.

Amanhã há mais (triagem, ecoponto, lixo).

quarta-feira, 21 de março de 2007

Primavera é quando uma mulher quiser...

Hoje dei-me conta de que vou ter três equinócios da Primavera sucessivos. Não é fenómeno do Entroncamento, é mesmo um ritmo errático de viagem entre hemisférios: em Setembro comecei a Primavera em Buenos Aires, em Março em Lisboa e no próximo mês de Setembro, outra vez em Buenos Aires. No meio disto tudo, falhei o Verão austral e agora perco o setentrional.

Para que me serve tanta Primavera se nunca chega o Verão?

Caixotes, caixotes

Os armários esvaziam-se e o chão enche-se de caixotes. Gastam-se jornais como jamais se haviam gastado nesta casa e crescem os sacos de lixo e de recicláveis. É a chamada limpeza da Primavera, mas levada um bocadinho ao extremo.

Coragem, já não falta tudo!

segunda-feira, 19 de março de 2007

Vento amigo

O tempo que se pôs hoje, onde é que já se viu?

A vantagem das rajadas de vento cortante é ter menos pena de abandonar a Primavera em direcção ao Outono. Há que ver os aspectos positivos das coisas!

Jantar marroquino

Não dá. Não há post que faça verdadeira justiça ao magnífico jantar que a Ana preparou para a minha despedida, na sexta-feira passada. Não há como explicar a sucessão de sabores maravilhosos e exóticos sobre a mesa. O prato era pequeno para tanta coisa tão boa!

Começámos com os aperitivos.

Não, mentira, começámos com a sangria. Muito pouco marroquina, mas muito, muito boa. De marroquina tinha talvez as especiarias!

E depois, sim, os aperitivos, enquanto esperávamos a chegada de todos os convivas. E que aperitivos! Duas pastas para barrar no pão, em aspecto vagamente parecidas com o já velhinho Tulicreme, em sabor diametralmente opostas. Uma, vermelho bem vivo, com um aroma a cominhos de comer e chorar por mais; a outra, com uma percentagem significativa de sementes de sésamo na sua composição, tinha a capacidade de aderência (ao dente e ao palato) dos vendedores nocturnos de rosas. Apesar da semelhança, e contrariamente a estes, presumo, sabia bem.

Mas não se pense que tudo se esgota nos aperitivos, porque não! Finalmente desfez-se o suspense da semana quando a Ana nos chamou à sala para nos irmos servir. E o que estava em cima da mesa... ui! Para mim, o melhor foi o peixe. Aquele peixe... só não me fui servir de mais porque infelizmente já não dava! O couscous, as kefta (almôndegas de carne de vaca), a salada de iogurte e a outra, de aipo e maçã, a "pastilha", massa folhada polvilhada com açúcar e canela e recheada de carne... que coisa absolutamente de sonho. Fiquei com pena de não ter levado recipiente para os restos.

Salvé, Ana, salvé a tua iniciativa, o teu gosto pela cozinha e o teu espírito exploratório e inventivo na criação de ementas para jantares! Alimenta as tuas cobaias, sim!

Ai... só suspiro... felizmente está para breve a tua visita a Buenos Aires!

A bela "pastilha" com açúcar e canela

Peixe espada com coentros e outras coisas boas que não identifiquei

A mesa, o prato e a minha barriga: todos pequenos para tanta coisa boa

quarta-feira, 14 de março de 2007

Estrangeiro em toda a parte

Ontem foi apresentado na Cinemateca um documentário realizado por Luís Campos Brás. Não sabia nada sobre o realizador pouco sobre o filme: um documentário filmado em Macau, por um rapaz que esteve lá uma temporada, com uma série de pessoas minhas conhecidas, com o título Voltar a A-má-gao: ponte entre uma fuga e um regresso. Admito que as expectativas eram poucas... e talvez por isso me tenha surpreendido agradavelmente. Gostei, gostei, só não sei se fui uma observadora isenta por conhecer espaços, pessoas e as sensações descritas...

...mas adiante.

O documentário mostra uma série de portugueses, na casa dos 20, 30 anos, que foi em miúdo para Macau a acompanhar os pais (tal como eu), veio para Portugal fazer o curso superior (alguns na minha faculdade!) e depois voltaram para lá. Cada qual tem suas razões, todas mais ou menos familiares.

O que mais me fez pensar, ainda assim, foi a parte em que reflectiram um pouco sobre o ser-se estrangeiro nos sítios. Ora... dava matéria para três ou quatro dissertações, é evidente, portanto vou tentar manter a reflexão sucinta. Diziam que se sentiam muito bem sendo estrangeiros em Portugal e que, quando se começavam a habituar a viver cá e a sentir-se "portugueses", que havia chegado a hora de partir outra vez. Residentes em Macau há já uma boa meia dúzia de anos, sentiam-se eternos estrangeiros.

E aqui está onde quero chegar. Agora que vou a caminho da Argentina, confesso que me sinto algo ambivalente em relação ao ser estrangeira. É uma posição muito cómoda, muito confortável, pois posso gozar as coisas boas que o país me oferece e simultaneamente distanciar-me dos aspectos negativos do sítio. Diziam lá no documentário que esta postura, para além de ser muito cómoda, era "oportunista e, paradoxalmente, de grande responsabilidade". Confesso que não alcancei a parte da responsabilidade; para mim parece-me precisamente o contrário, a sacudidela da água do capote. Parece-me que se aproveita o bom e se olha com alguma sobranceria (eventualmente "europocêntrica") para o mau.

Preocupa-me, é só isso.

terça-feira, 13 de março de 2007

Obrigado!

Não ligo muito a televisão cá em casa, por isso foi com surpresa que vi, noutro dia, um anúncio que não parecia bem um anúncio mas que também não parecia ser um programa da grelha normal daquele canal. Ia um homem pela rua e as pessoas agradeciam-lhe e acenavam-lhe e ele ia sorrindo, entre o curioso e o espantado com a vida. A primeira coisa que pensei foi que ele seria bombeiro - mas estava a achar muito estranho que estivessem a fazer assim uma publicidade institucional à classe (não que não merecessem... mas não me parecia plausível.).

Finalmente...

(um parêntesis: quem lê esta descrição poderá pensar que se trata de uma longa-metragem, mas não, é curtinho. Eu é que estou a descrever em câmara lenta, que é como a minha cabeça tem andado a processar os estímulos externos. Fecha parêntesis.)

...finalmente dá-se o desenlace da narrativa com a mensagem de "peça sempre a sua factura, sem facturação o país não avança".

Pois bem, concordo, está na altura de sensibilizar as pessoas para esta mensagem tão simples e acabar de vez (ou tentar!) com aquela pergunta idiota do "quer factura?". Claro que quero factura!

Só me lembro de, no Chile, ser absolutamente obrigatório passar um "boleto" a todo e qualquer cliente, mesmo que a quantia em questão se resuma a meia dúzia de pesos. Têm uns livrinhos de recibos muito práticos, com uns picotados que dividem cada folha em três ou quatro recibos. As pessoas preenchem cada fracção à mão, destacam e entregam ao cliente, mesmo que só tenham comprado um pacotito de pastilhas elásticas. E se, dados os meus maus hábitos portugueses, me esquecia de trazer o dito papel e saía porta fora, vinham atrás de mim a gritar: "su boleto, su boleto!". Quem pensava que a América Latina era só confusão...

quinta-feira, 8 de março de 2007

terça-feira, 6 de março de 2007

O poder da imagem

Da próxima vez que tiver uma insónia, juro que me ponho a fazer uma bela pesquisa de fotografia em bancos de imagem. Não há nada no meu trabalho com maior poder soporífero.

Pesquisar letras anda lá perto. Mas, apesar de tudo, como volta e meia há algumas que não estão boas e outras que podem ser classificadas noutras categorias, sempre há um ligeiro sobressalto de adrenalina quando tropeçamos numa delas.

Agora a pesquisa de imagem é que me baixa mesmo as ondas cerebrais a níveis jamais observados, nem mesmo se me fizessem uma TAC a ver televisão ao Domingo à tarde.

domingo, 4 de março de 2007

Fim de uma era

Ontem e hoje enfiei o atelier todo dentro de caixotes. Destino: arrecadação da casa dos pais. Acho que deve ser isto o que acontece aos pacotes de todos os emigrantes da minha geração.

Hoje estive também a ver onde vou colocar - dentro da algo ocupada arrecadação - os móveis, electrodomésticos, pratos, copos talheres, roupa de cama... enfim, as "coisas" daqui de casa. Parece-me característica do nosso mundo conseguirmos acumular uma impressionante quantidade de coisas absolutamente dispensáveis das quais não nos queremos desfazer.

Acho que a parte mais difícil de decidir que destino vai ter é todo aquele conjunto de fotografias, postais, recortes de revistas, bilhetes, cartões antigos e demais objectos caricatos que pregamos no painel de corticite na parede. Parece tão pouco para ir para um álbum mas tão valioso para ir para o lixo.